07/07/23
access_time 08:30h
location_on São Paulo-SP
Descrição do Evento
CIAD 2023 19o Congresso Brasileiro Interdisciplinar de Assistência Domiciliar
“Cuidar se aprende cuidando.”
Parafraseando nosso grande mestre Drummond e sua belíssima obra, “Amar se aprende amando”, não há assertiva maior do que a que escolhemos
como tema central do evento que ora se apresenta: CUIDAR SE APRENDE CUIDANDO. Não há teoria, conjecturas ou experimentos que substituam o exercício cotidiano que é cuidar. Cuidar do outro, de si, da
cidade em que moramos, do bairro e porque não, do mundo que habitamos. Mas “sem omitir o real cotidiano, também matéria de poesia” o cuidado ao outro, nos dias atuais, tem sido relegado a segundo plano,
seja pela correria justificada do dia a dia, pelo narcisismo injustificável que
domina, pela banalização quase normalizada do descuido, seja pela sensação de
impotência e insuficiência que nos cerca. Cuidar do outro?! Não dou conta de
cuidar de mim mesmo! É a frase que impera. Mas cuidar é do gênero humano, e muito mais do que inato, como querem acreditar alguns, constitui-se em um exercício que requer
aprendizado, paciência, constância, altruísmo e, principalmente, querer. Na área da Saúde aprendemos a cuidar tecnicamente , especializando-nos primeiramente na profissão que escolhemos, em que teoria e
prática, aptidão e frustação se somam na experiência que vai se acumulando no
nosso dia a dia. Quanto mais experiência temos, mais reconhecemos nossa
incompletude e parcialidade. Só essa vivência nos mostra o quanto precisamos do
outro, seja esse outro paciente, família, profissionais de diferentes áreas,
colegas da mesma profissão ou parceiros institucionais. O cuidado só se
concretiza na relação; seja esta relação de amor, dor, responsabilidade,
conveniência, obrigação, devoção. “O tempo passa? Não passa.” Recita-nos o poeta. Sensação presente nos relatos dos pacientes graves e cronicamente enfermos,
cuja vida, às vezes se resume em ser doente. “Eu quisera ver o mundo”, continua Drummond, mas avida foi reduzida à tarefa de cuidar do familiar enfermo por décadas de
dependência, em algumas situações, sem auxílio, sem políticas públicas
condizentes com a necessidade das famílias vulneráveis e sem nenhuma garantia
após o desenrolar da situação. Sobre “o primeiro morto”, verseja nosso poeta maior. Quantos familiares vivem essa situação pela primeira vez? Quais os
cuidados a serem dispensados pelas equipes de atenção domiciliar no intuito de
garantir uma morte digna e não traumática para quem a acompanhará? Como não poderíamos esquecer, a pandemia nos mostrou que “uma pedra havia no meio do caminho”. Uma “pedra” que nos relegou
ao isolamento social, nos obrigou a repensarmos nossas prioridades e
necessidades, a valorizarmos o que anteriormente nem notávamos existir e a
convivermos com uma doença grave, com a morte ou com o risco desta. Mas “a
pedra”, contornada no caminho, deixou seu legado: aprendemos? Ainda estamos
aprendendo: os limites e possibilidades dos atendimentos online, dos cursos à
distância e das aproximações com segurança. Limites espaciais, emocionais e
institucionais; o quanto o distanciamento social nos protege, mas também isola,
impacta e faz sofrer. “O mundo é grande”, nos lembra Drummond, mas pode se resumir à casa visitada diariamente para quem nela habita. Um mundo de
valores, fragilidades, possibilidades, amor, desamor, cuidados e descuidos. Um
mundo que requer respeito e cuidado. “Cuidar se aprende cuidando”: aprende-se no dia adia da atenção domiciliar que atender no mundo do outro é, primeiramente se
despir de certezas prévias e reconhecer limites, possibilidades, fragilidades e
potências de cada um de nós, profissionais, e principalmente do espaço que nos
é aberto para também aprendermos a nele estar. Um espaço que pode nos limitar,
mas por outro lado, pode nos abrir um universo de possibilidades. Essa é a proposta do CIAD 2023: demonstrar como tem se tornado grande o mundo da assistência domiciliar brasileira, frente ao
desafio lançado pelo poeta: “o mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar”. Letícia Andrade
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